O que parecia ser apenas mais uma mansão de luxo usada por influenciadores para criar conteúdo virou o centro de um dos casos mais chocantes do mundo digital brasileiro. Hytalo Santos, conhecido nas redes por seu estilo extrovertido e por comandar um verdadeiro império de vídeos virais com adolescentes, está agora no olho do furacão. As revelações feitas por ex-funcionários ao programa Fantástico, da TV Globo, levantaram sérias acusações que envolvem exploração, negligência, manipulação e, o mais grave: um ambiente que, segundo relatos, era tudo menos seguro para menores de idade.

A reportagem trouxe à tona um lado sombrio da rotina na casa de Hytalo Santos, que muitos viam como uma espécie de “república da fama”, onde jovens talentos ganhavam visibilidade, moradia e uma chance de mudar de vida. Mas por trás dos vídeos bem produzidos e das redes bombando, existia um cotidiano alarmante.

Ex-funcionários relataram que os adolescentes viviam sob regras rígidas impostas por Hytalo. Eles não tinham liberdade para decidir nem mesmo quando comer ou dormir. Tudo girava em torno das vontades do influenciador. Um dos relatos mais chocantes descreve um episódio em que ele mandou os jovens fingirem que estavam indo à escola apenas para aparecerem nos stories — logo depois, mandou tirarem as mochilas e disse que não precisavam estudar naquele dia.

Segundo essas fontes, o descaso com a educação era frequente. Um dos adolescentes chegou a ficar cerca de 50 dias sem frequentar aulas. Quando havia compromissos ligados à produção de conteúdo, Hytalo não hesitava em retirar os jovens da escola, sem aviso prévio, para priorizar gravações.

Outro ponto revelado pela reportagem foi a higiene precária dentro da mansão. Apesar da aparência luxuosa nas redes, o ambiente era descrito como sujo e desorganizado. “Era uma mansão por fora, mas por dentro era uma bagunça, sem limpeza e com um clima pesado”, contou uma ex-funcionária, que preferiu não se identificar.

Além disso, surgiram relatos de que os celulares dos adolescentes eram recolhidos e guardados em uma caixa no quarto do próprio Hytalo, supostamente para evitar gravações que mostrassem o que acontecia nos bastidores. Eles tinham acesso limitado à comunicação com o mundo externo — algo que, segundo os especialistas, pode caracterizar controle psicológico.

E não para por aí. Uma das denúncias mais graves envolve o acesso irrestrito a bebidas alcoólicas. Segundo os ex-funcionários, os menores podiam consumir álcool livremente dentro da casa. Um verdadeiro absurdo quando se considera a idade dessas crianças e adolescentes, além da responsabilidade que recai sobre qualquer adulto que os tenha sob sua guarda.

A adolescente conhecida como Camilinha também foi citada na reportagem. Ela teria engravidado do irmão de Hytalo enquanto morava na mansão, e tudo isso ocorreu sob o olhar complacente de adultos que deveriam protegê-la. O caso escancara a fragilidade com que as relações eram tratadas na casa — relações essas que envolviam menores de idade, questões emocionais, afetivas e até responsabilidades parentais.

Para piorar, os pais das crianças e adolescentes não apenas permitiam essa convivência como, em muitos casos, recebiam uma espécie de “mesada” entre R$ 2 mil e R$ 3 mil por mês para permitir que seus filhos morassem com o influenciador. Nenhuma denúncia formal havia sido feita ao Conselho Tutelar até que tudo veio à tona pela mídia e pela investigação policial.

Os responsáveis alegavam que viam em Hytalo uma chance de dar uma vida melhor aos filhos. Venderam casas, largaram empregos e apostaram todos os sonhos na promessa de sucesso feita por um influenciador carismático. Mas essa aposta, ao que tudo indica, custou caro.

O procurador da Paraíba, Flávio Gondim, classificou o ambiente como um “reality show disfarçado”, com exploração comercial de menores, monetização de vídeos e diversas formas de lucratividade nas plataformas digitais. Ele foi direto ao ponto: “Inquestionável a existência de uma relação de trabalho entre os adolescentes e Hytalo Santos.”

Enquanto isso, Hytalo continua negando todas as acusações. Em entrevista ao Fantástico, recebeu a equipe da Globo em sua casa e disse que tudo está sendo distorcido. Contudo, o material colhido pela produção e os testemunhos são contundentes. E a Justiça começa a agir: já foi determinada a quebra de sigilo de e-mails usados para enviar ameaças contra o influenciador digital Felca, que tem sido uma das vozes mais ativas nas denúncias do caso.

Felca, inclusive, recebeu ameaças de morte após expor detalhes desse escândalo, mas afirmou que não irá se calar. “Estou fazendo algo que é mais importante do que eu”, declarou. Ele foi reconhecido pela Associação Brasileira de Psiquiatria como parceiro na luta pela saúde mental e tem utilizado sua visibilidade para pressionar as autoridades e dar voz às vítimas.

Em paralelo, a jovem Camilinha concedeu entrevista ao Domingo Espetacular, da Record, tentando suavizar a imagem de Hytalo. Disse que nunca viu exploração, que tudo era “normal” e que só queria viver sua vida em paz. Sua mãe, que abandonou tudo para seguir a filha na vida com o influenciador, também defendeu o ambiente. “Ela teve infância. Como é que dizem que ela foi adultizada?”, questionou.

O pai, por outro lado, tem uma visão diferente. Já havia denunciado o caso ao Conselho Tutelar em 2019, mas segundo ele, “a Justiça é lenta demais”. Ele segue lutando para que a verdade venha à tona e sua filha tenha proteção real.

O que resta agora é esperar pelas ações das autoridades e da Justiça. Mas o alerta está dado. Este caso expõe, com brutalidade, os riscos da exposição precoce de menores nas redes sociais e da idealização cega de influenciadores. Nem tudo que brilha nas telas é ouro — e, às vezes, o que está por trás dos likes são histórias que ninguém deveria aplaudir.